O que era previsão vai se cristalizando. Os mais recentes movimentos, em Brasília, da alta cúpula do PMDB e dos partidos aliados, evidenciam uma tentativa de barrar a Operação Lava Jato. Em meio a uma crise política que persiste por meses, essa é a avaliação de alguns sindicalistas e integrantes ligados à Operação, que se tornou maior símbolo de combate à corrupção no País. E o esforço para estancar as ações da Polícia Federal (PF), que têm atingido políticos e empresários de grande estatura, surge por várias frentes no Legislativo Federal, o que tem acendido o alerta dos que atuam no combate aos crimes contra os cofres públicos.
No Planalto, o presidente interino Michel Temer (PMDB) decidiu, na última semana, retirar a urgência do pacote anticorrupção de Dilma Rousseff e pensa em colocar o juiz federal responsável pela Lava Jato, Sérgio Moro, no Supremo Tribunal Federal. Entre as medidas do pacote da presidente afastada, estão a criminalização do caixa dois de campanha e a tipificação de enriquecimento de servidores públicos sem comprovação da origem do patrimônio, como crime. Paralelamente a isso, dois delegados envolvidos, diretamente, na Operação, em Curitiba, foram afastados sem justificativa.
Na Câmara e no Senado, alvos da operação também vêm agindo para barrá-la, com projetos que atingem, diretamente, o bom desempenho da Lava Jato. Propostas de delimitar as delações premiadas, que têm servido como principal arma do Judiciário para desvendar os esquemas de corrupção, correm soltas. Oito são as proposições para impedir a delação, sendo sete na Câmara e uma no Senado.
Abuso de autoridade
Na Casa Alta, as articulações não param por aí. Dois dos principais alvos da Operação Lava Jato, o presidente Renan Calheiros e Romero Jucá, ambos do PMDB, articulam-se para colocar em pauta uma matéria de 2009, que versa sobre abuso de autoridade. Uma comissão especial para analisar o tema foi criada, na última semana, especialmente para esse fim, tendo Jucá como presidente. O texto restringe, por exemplo, o alcance da Polícia Federal e do Ministério Público sobre os crimes cometidos por integrantes da administração pública. Se o projeto for aprovado, ele prevê punições que vão desde o pagamento de indenizações às vítimas dos abusos – leia-se, aos investigados nas operações – até a perda do cargo público por policiais e procuradores federais.
O projeto determina, ainda, penas para autoridades que divulgarem “antes de instaurada a ação penal, relatórios, documentos ou papeis obtidos como resultado de interceptação telefônica, de fluxo de informação informática ou telemática, de escuta ambiental”. O procurador da República, Deltan Dallagnol, já vaticinou: “O oferecimento desse pacote de abuso de autoridade, neste momento, não pode ter outra razão senão atrapalhar o trabalho da investigação”.
Segundo Dallagnol, que é coordenador da força-tarefa da Lava Jato, medidas como a que versam sobre o abuso de autoridade e a restrição da delação colocarão em risco operações e investigações semelhantes à Lava Jato. Ele lembra que, só com delações, bilhões de reais desviados dos cofres públicos foram recuperados.
Membro do Ministério Público de Contas (MPCO), o procurador Cristiano Pimentel vê com certo temor as movimentações. “Isso é muito preocupante. O momento por que passa o País exige que se faça uma depuração de todos esses escândalos de corrupção e quando vemos pessoas influentes no Congresso tentando passar medidas legislativas que sejam contra esses esforços, isso preocupa muito todos os membros do Ministério Público e toda sociedade civil organizada”.
Fonte:FolhadePernambuco
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